Juntas, FCA e PSA se tornam a quarta maior companhia do setor no mundo, com valor de mercado estimado em US$ 50 bilhões
O grupo automobilístico francês Peugeot Citroën (PSA) buscou, nos últimos dois anos, um parceiro comercial à altura de suas estratégias globais de mobilidade, incluindo carros elétricos e veículos compartilhados. A procura teria levado a negociações com um grupo chinês e com a General Motors, de quem a PSA adquiriu a marca Opel, em 2017. Mas a união será com a ítalo-americana Fiat Chrysler Automobiles (FCA), dona de marcas como Fiat, Jeep, Dodge e Alfa Romeo.
Na noite de quarta-feira (30/10), as duas empresas anunciaram que chegaram a um acordo para a fusão. O novo gigante do setor automobilístico já nasce com valor de mercado estimado em US$ 50 bilhões (cerca de R$ 200 bilhões) e será o quarto maior grupo automotivo do planeta, com quase 9 milhões de carros vendidos, atrás apenas da Volkswagen, da aliança Renault-Nissan-Mitsubishi e da Toyota.
Em comunicado oficial, as empresas divulgaram que “o plano para combinar os negócios resulta de intensas discussões entre a alta gestão das duas companhias” e que “ambas compartilham da convicção de que há lógica convincente para esse movimento ousado e decisivo”. Segundo a nota, o objetivo é unificar forças para criar um líder mundial em uma nova era de mobilidade sustentável.
Para o analista sênior da consultoria americana Morningstar, Richard Hilgert, a união das duas companhias vai dar maior musculatura ao grupo em mercados gigantescos, como a China. Segundo ele, apenas com ganhos de sinergia as duas empresas seriam capazes de disputar o maior mercado automobilístico do mundo, responsável por comprar, por exemplo, 50% de todos os automóveis elétricos produzidos atualmente no planeta. “Vemos a combinação destas duas companhias como razoável dada a competição global, alto nível de investimento e avanços como eletrificação e tecnologias de direção autônoma”, disse Hilgert.
O contrato pré-nupcial prevê que os acionistas da FCA e da PSA terão o mesmo poder no controle do grupo: 50% para cada lado. As ações da companhia serão negociadas nas bolsas de Milão, Nova York, Paris e no pregão da Euronext. Também já ficou acordado que o atual presidente da FCA, John Elkann, assumirá a presidência do Conselho da nova montadora, enquanto o executivo-chefe da PSA, Carlos Tavares, será o CEO e membro do Conselho, com mandato inicial de cinco anos. Tavares afirmou que “essa convergência traz valor significativo para todas as partes envolvidas e abre um futuro brilhante para a entidade combinada”.
Os números reforçam essa ideia, já que a nova companhia terá cerca de 400 mil funcionários e tem a meta de gerar quase 4 bilhões de euros em sinergias anuais de curto prazo, e já anunciou que não pretende fechar nenhuma fábrica – diferentemente do que outras montadoras estão fazendo mundo afora.
Somadas, as receitas da FCA e da PSA chegam a quase R$ 750 bilhões, com lucro operacional recorrente em torno de R$ 50 bilhões. O comunicado divulgado pelas companhias destaca pontos cada vez mais importantes para o setor, como mobilidade conectada, veículos elétricos e autônomos e investimentos em pesquisas e sustentabilidade. De acordo com o texto, o objetivo é “estimular a inovação e vencer desafios com rapidez e eficiência de capital”.
A nova companhia produzirá veículos de todos os segmentos em que FCA e PSA já têm atuação de peso, como carros de luxo, premium, de passeio, SUVs, picapes e comerciais leves. A intenção é “agregar as capacidades extensivas e crescentes das empresas em termos de tecnologias que estão criando uma nova era da mobilidade sustentável, incluindo motorização elétrica, direção autônoma e conectividade digital”. Já foi definido, também, que a sede da empresa será na Holanda e que seu Conselho de Administração terá representação equitativa e maioria de diretores independentes.
Agora, a proposta da fusão será submetida ao processo de informação e consulta aos órgãos representantes dos empregados e estará sujeita às condições habituais de fechamento da operação, incluindo aprovações finais do Memorando de Entendimentos pelos Conselhos de Administração e acordo sobre documentação definitiva.
De fusão e aquisição, FCA e PSA entendem. Ambas as empresas são resultado de fusões anteriores. A FCA nasceu da união entre os grupos Fiat e Chrysler, enquanto que a PSA é resultado da incorporação da Citroën pela Peugeot, da alemã Opel e da britânica Vauxhall. Nos dois casos, os processos de fusão foram bem-sucedidos, criando companhias mais fortes, sólidas e lucrativas.
Mesmo que FCA e PSA concluam, de fato, a união de suas operações, os investimentos não devem ser afetados no Brasil. No ano passado, assim que o programa Rota 2030 foi anunciado, o presidente da companhia no Brasil, Antonio Filosa, garantiu que o plano de investimentos alcançaria R$ 16 bilhões até 2022.
Além de ampliação e modernização de suas fábricas na cidade mineira de Betim e em Goiana, no interior de Pernambuco, o dinheiro tem sido gasto no lançamento de 25 modelos nesse período – principalmente nos segmentos de utilitários urbanos e de picapes grandes, com a possibilidade de estreia da marca RAM no Brasil. “Agora que sabemos qual é a direção, dentro de um ambiente de regras mais sólidas, queremos fortalecer a nossa atuação em todos os segmentos e entrar de forma consistente naqueles que ainda não estamos”, garantiu Filosa, ao anunciar naquela época as estratégias de longo prazo.
Apenas a marca Fiat vai lançar, em 2021, dois SUVs desenvolvidos no Brasil, um compacto e outro maior, do porte do Jeep Compass. A fábrica de Goiana, em Pernambuco, está desenvolvendo um SUV de maior porte, mais encorpado que o Compass. Em 2015, a Fiat inaugurou a fábrica de Pernambuco, sua segunda unidade industrial no Brasil, primeira e única da marca na região Nordeste.
De julho de 2018 até 2024 estão previstos R$ 16 bilhões para a América Latina, com foco no Brasil, R$ 8,5 bilhões em Betim (MG) e R$ 7,5 bilhões no polo Jeep, em Pernambuco. O Brasil representa 10% do volume global de vendas do Grupo FCA e 14% do resultado (lucro) global.
Em recente entrevista ao jornal Financial Times, o CEO da FCA, Mike Manley, demonstrou muito interesse em se unir a outro grupo automobilístico. “A FCA tem um futuro sólido como uma empresa independente, mas isso não significa dizer que, se houver um futuro melhor através de uma aliança e parceria ou fusão, que não estaríamos abertos e interessados nisso”, disse o executivo, dias antes de revelar a fusão com a PSA.